quarta-feira, 30 de março de 2022

DA REVOLUÇÃO À ESTABILIZAÇÃO DA DEMOCRACIA

 O Movimento das Forças Armadas e a eclosão da Revolução


Em Fevereiro de 1974 o general António de Spínola publicou um livro "Portugal e o Futuro" onde exprimia a sua crença na impossibilidade de uma vitória armada nas colónias. Um mês depois, uma sublevação militar da cavalaria das Caldas da Rainha demonstrava à população que o exército se movimentava e que um golpe de estado poderia sobrevir a todo o momento. Vários capitães do exército estavam por detrás deste movimento que, organizando reuniões de preparação em casa de alguns dos oficiais, acabou por levar ao Movimento das Forças Armadas. 

Protestando inicialmente contra o acesso de oficiais milicianos aos quadros permanentes do exército, o movimento dos capitães assumiu gradualmente uma feição mais generalista nas  suas reivindicações obrigando o governo a aceitar uma solução negociada para o problema da guerra colonial, tendo para isso procurado o apoio de alguns dos generais mais proeminentes do exército, Spínola e Costa Gomes. 
Sabendo da situação, Caetano exigiu aos seus generais que renovassem a lealdade aos propósitos governamentais e à política seguida, o que aqueles oficiais não fizeram tendo sido demitidos dos seus cargos um mês antes da revolução. Os acontecimentos precipitaram-se e o MFA preparou as movimentações que iriam terminar com o regime. 
Entre os operacionais do movimento contam-se alguns capitães e outras patentes superiores: Otelo Saraiva de Carvalho, Vítor Alves, Salgueiro Maia. Vários acontecimentos foram marcantes na evolução dos acontecimentos: 



  • a rendição das tropas do regime na Rua do Arsenal. 
  • a ocupação dos estúdios da rádio e RTP
  • o cerco ao quartel do Carmo onde estava refugiado Marcelo Caetano e a sua rendição
  • a rendição difícil da DGS na rua António Maria Cardoso. 
A revolução foi rápida e pacífica com grande apoio e consenso da população. 

A caminho da Democracia - desmantelamento das estruturas do Estado Novo

Entre 25 de Abril de 74 e a aprovação da Constituição de 1976, o país conheceu alguma instabilidade e várias situações de tensão: 
  • No dia 25 de Abril de 1974 tomou posse a Junta de Salvação Nacional. 

  • Américo Tomás, Primeiro Ministro, Governo e todos os governantes e autarcas foram destituídos
  • Os principais empresários do país fugiram para o Brasil. 
  • Todos os organismos do estado e instituições repressivas foram dissolvidos e os presos políticos libertados. Os exilados regressaram.





  • Foi autorizada a formação de partidos e agrupamentos políticos sendo restauradas as liberdades políticas e individuais. 
  • Foi assumido o compromisso de eleições para a assembleia constituinte no prazo máximo de um ano. 
Tensões político ideológicas

Entre 1974 e 1976 o país assistiu a uma sucessão de acontecimentos marcados pela gestão política de algumas figuras que se tornaram marcantes. 
António de Spínola foi designado pela Junta de Salvação Nacional para presidente da República. O período compreendido entre 25 de Abril de 74 e 28 de Setembro do mesmo ano foi marcado por alguma tensão e controvérsia dadas algumas posições conservadoras de Spínola. O 1º governo provisório demitiu-se enquanto Spínola defendia uma solução federalista para as colónias. O MFA e o novo governo de Vasco Gonçalves consideravam que era necessária em vez disso a simples independência sem condições, dos territórios. Vasco Gonçalves sucedeu a Palma Carlos e Spínola acabou por se demitir por discordar de semelhante solução. 
Costa Gomes tornou-se então presidente da República, enquanto Vasco Gonçalves se mostrava comprometido com a esquerda e adotava uma série de medidas de carácter popular influenciado pelo Partido Comunista.
Em 11 de Março, Spínola reuniu algumas forças militares e procurou tomar de novo o poder invertendo o rumo revolucionário dos acontecimentos mas falhou nos intentos e foi obrigado a sair do país juntamente com os apoiantes.

A esquerda reforçou-se e formou-se o Conselho da Revolução concentrando os poderes do Conselho de Estado e da Junta de Salvação Nacional; era a época do PREC.


Nesse período o Partido Comunista ganhou protagonismo tendo sido tomadas medidas de carácter revolucionário com o apoio de Vasco Gonçalves, primeiro ministro, e do COPCON de Otelo Saraiva de Carvalho: ocupações de terras, saneamentos de empresas, comissões de moradores, ocupações de casas, ocupações de empresas e expulsão dos sócios gerentes  foram algumas das muitas situações só compreensíveis pelo ímpeto revolucionário que se apoderava das pessoas. Tal clima, desfavorável à alta burguesia e aos empresários obrigou muitos a exilarem-se em Espanha ou no Brasil. 

Centro de documentação 25 de Abril da Universidade de Coimbra 

As eleições de 1975 e a inversão do processo revolucionário
A evolução revolucionária do país não impediu a realização das eleições para a Assembleia Constituinte que se realizaram em 25 de Abril de 1975. Nestas ganhou o partido socialista que conseguiu o maior número de deputados da Assembleia, factor que teve grande importância na inversão do processo revolucionário até então muito centrado na esquerda comunista. No verão de 1975 a par do abandono pelo PS e PSD dos cargos do governo a situação tornou-se difícil com assaltos a sedes partidárias, manifestações de rua, e surgimento de organizações armadas de carácter revolucionário. 
Melo Antunes e vários oficiais moderados do Conselho de Revolução criticaram a orientação governativa de Vasco Gonçalves  substituindo-o pelo Almirante Pinheiro de Azevedo e à substituição de Otelo pelo capitão Vasco Lourenço. Reagindo contra esta situação alguns sectores do exército tentaram um novo golpe militar, o 25 de Novembro que no entanto não teve êxito. 
Afinal não foi tudo linear nem tão pacífico como pensávamos...

Política económica anti monopolista e intervenção do Estado 
Várias medidas tomadas durante os anos de 74 e 75 tiveram como objetivo a destruição dos grandes grupos económicos, considerados monopolistas, apropriação pelo Estado dos setores chave da economia e o reforço dos direitos dos trabalhadores. 

Várias medidas foram emblemáticas da ação de controlo e estatização da economia numa ótica marxista e socializante: 
  • a nacionalização dos grande grupos económicos e dos bancos emissores,
  • nacionalização de bancos e companhias de seguros privadas,
  • no sul do país dão-se ocupações de terras principalmente no sul do país foram expropriadas grandes herdades e formadas UCP que detinham a posse das máquinas agrícolas e administradas em autogestão. 
A Constituição de 1976
A ação dos deputados foi desde o início condicionada pela sua assinatura de um compromisso individual de respeito pelas conquistas revolucionárias, situação que condicionou a natureza da lei fundamental e imbuiu a constituição de uma natureza esquerdista e fortemente socializante considerando irreversíveis as nacionalizações e expropriações e reconhecendo ao Conselho da Revolução o seu carácter de garante do respeito pelas conquistas do 25 de Abril. 
A  constituição instaurava o multipartidarismo e o respeito pela autonomia das regiões insulares além de um poder local eleito por sufrágio universal e direto. A Constituição entrou em vigor em 25 de Abril de 1976. 

 
O reconhecimento dos movimentos nacionalistas e o processo de descolonização 
A independência e a autonomia total foram desde o dia 25 de Abril exigidos por várias organizações internacionais entre as quais a OUA e a ONU. Os processos de descolonização foram também aceites pela população metropolitana que via desta forma a maneira de evitar o envio de mais tropas para as colónias. É assim que o Conselho de Estado reconheceu na lei 7/74 o direito das colónias à independência levando ao inicio das conversações com os movimentos de independência. 

A Guiné tornou-se independente em Setembro de 1974 e nos restantes territórios dava-se inicio a um processo de transição de alguns meses que permitira a passagem dos poderes e a saída tranquila e organizada dos colonos. No entanto o clima favorável a uma resolução rápida do processo permitiu facilmente aos movimentos de independência  o controlo do território sem o necessário e acordado respeito pelos bens dos portugueses que aí residiam pelo que os seus interesses acabaram por se ver ultrapassados e a saída dos colonos tornou-se aflitiva e desorganizada sem o respeito pelos bens pessoais e familiares. 
As populações brancas fugiram rapidamente em Moçambique enquanto em Angola a guerra civil entre as fações armadas procurando controlar zonas de território tornou dramática a saída dos colonos. Estes procuraram como puderam sair do território através de uma ponte aérea com o alojamento no continente feito em condições muito precárias mas que eram as possíveis. 



Muito marcada pelo espírito revolucionário e pela opção socializante e esquerdista dos órgãos de poder, a primeira revisão constitucional concluiu-se em 1982. Mantendo ainda opções à esquerda e uma feição populista alteraram-se alguns dos artigos relacionados com as instituições governativas: 
  • abolido o Conselho de Revolução remetendo as forças armadas para o seu papel tradicional de sustentáculo do poder democrático.
  • foram limitados os poderes do presidente e ampliados os poderes do parlamento. O PR passou a ser eleito por sufrágio directo e universal e maioria absoluta sendo assistido por um Conselho de Estado. 
  • A Assembleia da República é formada por deputados eleitos pelos círculos eleitorais sendo o órgão legislativo por excelência 
  • O Governo é o órgão executivo por excelência conduzindo a política geral do país. 
  • Os tribunais que mantêm a sua independência sendo os juízes nomeados pelos conselhos superiores de Magistratura e não pelo ministro. Surgiu ainda o Tribunal Constitucional que delibera sobre disposições constitucionais. 

O significado internacional da revolução portuguesa

Regozijando-se  pela revolução democrática, o mundo acabou por seguir uma evolução paralela à do país. A guerra do Vietname teve um fim e outros regimes de ditadura acabaram: na Grécia, na Espanha e em outros países, mudanças revolucionárias puseram fim a regimes de carácter fascista. Também a independência das colónias portuguesas veio enfraquecer o regime de apartheid da África do Sul que no entanto durou mais uma década e meia aproximadamente enquanto na Rodésia o regime de Ian Smith deu lugar em 1980 a um governo africano liderado por Robert Mugabe. 

quinta-feira, 17 de março de 2022

IMOBILISMO POLÍTICO E CRESCIMENTO ECONÓMICO - PORTUGAL DO PÓS-GUERRA A 1974

 A estagnação do mundo rural


A neutralidade de Portugal durante a guerra permitiu a permanência do regime salazarista que soube habilmente conduzir a diplomacia e evitar alianças incómodas. Nos anos 70 em vésperas da Revolução dos Cravos o país continuava atrasado e desfasado da evolução das economias europeias. 

No aspeto agrícola, sector protegido pela retórica tradicionalista do poder o país estava mergulhado no atraso com velhas técnicas e uma exploração agrícola antiquada e pouco produtiva. Apesar do grande número de pessoas que dependiam da terra a produtividade era baixíssima e não atingia metade da média europeia. 
No II Plano de Fomento de 1959, procurou-se modernizar a agricultura e promover a exploração agrícola mecanizada e de média dimensão como base para um bom rendimento dos proprietários e um nível de consumo que sustentasse a indústria. No entanto contra essas medidas se terão erguido as vozes dos grandes proprietários do sul que procuraram inviabilizar tais esforços. 
Incentivos e subsídios acabaram nas mãos de vinhateiros e latifundiários desta forma desviando-se dos objetivos que tinham estado na sua base. Também os preços agrícolas e os salários se mantiveram muito baixos com isso se prejudicando a rentabilidade das explorações e de toda a economia. 
A emigração
A emigração foi a solução para muita da gente do interior mas também das cidades. Eternizando a pobreza o país perdeu dinamismo com a emigração. Esta, tornou-se mais intensa à medida que o atraso dos campos se acentuava face a uma Europa onde as condições de vida melhoravam a todo o momento. O défice agrícola cresceu para 25% do défice global do país. 
A emigração teve razões políticas também com a fuga de muitos jovens à guerra colonial ao longo dos anos 60. Clandestina na maior parte das situações a emigração forneceu muito capital à nossa economia por via das remessas que eram permitidas pelos acordos de transferência de capitais. 
A emigração se teve algumas vantagens nomeadamente económicas teve inconvenientes no envelhecimento da população e reduziu a população ativa. 

O desenvolvimento industrial 
Apesar da política de autarcia desenvolvida por Salazar o país continuou dependente do fornecimentos de matérias primas, bens e equipamentos importados. A guerra acentuou a escassez e chamou a atenção para a necessidade de industrializar o país. 
Em 1945 a Lei de Fomento e Reorganização Industrial estabeleceu as bases da política de industrialização das décadas seguintes que no entanto acentuava a vertente de isolacionismo económico que vinha sendo desenvolvida. O I Plano de Fomento (1953 a 1958) acentuou o investimento público na modernização de infraestruturas de comunicação, eletricidade e transportes. 
O II Plano de Fomento desenvolvido entre 1959 e 1964 incidiu privilegiadamente nas indústrias transformadoras de base como as alimentares químicos, petróleos, siderurgia etc. Esta fase assistiu à entrada de Portugal na EFTA, a assinatura dos acordos de comércio livre e acordos com o Banco Mundial e o FMI. Entre 1965 e 1967 desenvolveu-se um Plano Intercalar de Fomento que prenunciou novas orientações do comércio e do investimento viradas para o comércio externo. O conjunto destas medidas representou o abandono das políticas de autarcia e de isolamento e a entrada de investimento estrangeiro no país através da instalação de várias linhas de montagem de bens de consumo como automóveis e eletrodomésticos. 
O 3º Plano de Fomento desenvolvido a partir de 1968 por Marcelo Caetano aceitava claramente as regras do comércio internacional e apoiava a lógica de concorrência e de concentração empresarial além de incentivar a exportação nomeadamente de têxteis, lanifícios e calçado e o investimento estrangeiro no país. 

Urbanismo 
A par das transformações económicas processou-se uma transformação urbana assinalável. As migrações de populações rurais para os grandes centros urbanos acentuou-se atraídas pelo emprego na indústria e comunicações então em grande desenvolvimento. Cidades desde Braga a Setúbal conheceram grande expansão. No entanto, a par desta migração não houve a correspondente construção de infraestruturas que continuaram obsoletas. Os ordenados mantiveram-se também a níveis muito baixos e o modelo de desenvolvimento não permitia um crescimento assinalável do PIB motivo pelo qual continuavam a existir muitos bairros de lata, construções clandestinas e falta de saneamento básico e de transportes públicos eficientes.  

O fomento económico das colónias 
O modelo de desenvolvimento das colónias foi até aos anos 40 o tradicional sem grandes investimentos industriais remetendo as colónias para o papel de fornecedoras de matérias primas aliás conforme o estipulado no Ato Colonial de 1930. A partir de 1953 o desenvolvimento das colónias seguiu a par com o estipulado nos planos de fomento estimulando-se o investimento público e privado e abrindo-se as portas ao investimento estrangeiro. Desenvolveram-se infraestruturas de transportes e os sectores agrícolas e extrativo. Também a industrialização se desenvolveu com capitais privados e estrangeiros atraídos pelas riquezas imensas dos territórios mesmo após o início da guerra colonial período durante o qual o investimento ainda aumentou mais. 

Radicalização de posições e o sobressalto político de 1958
Com o final da guerra e o fim das ditaduras do eixo também em Portugal se anunciavam mudanças que se acreditava poderem mudar a face do país. Convocaram-se eleições livres antecipadas e anunciaram-se medidas de revisão constitucional. Ainda no ano de 1945 fundou-se o MUD - Movimento de Unidade Democrática, fizeram-se propostas de alteração do calendário eleitoral e sugeriram-se mudanças: 

  • liberdades de reunião, expressão e de opinião, 
  • reformulação de cadernos eleitorais 
  • adiamento das eleições para permitir a formação de partidos. 

As reivindicações não foram satisfeitas. As listas de adesão ao MUD foram analisadas pela política que exerceu repressão sobre todos aqueles que ao movimento tinham aderido. 

A evolução das tensões da Guerra Fria e o alastramento do comunismo na Europa sobressaltaram o regime, travaram as reformas e Portugal aderiu à NATO. 
Em 1949 novo ato eleitoral para eleição de Presidente da República viu a candidatura de Norton de Matos surgir no quadrante democrático mas o clima de repressão obrigou-o a desistir. 
O acontecimento seguinte que concentrou os esforços da oposição foram as eleições de 1958  também para a Presidência da República. O candidato do regime era Américo Tomás enquanto o da oposição era o general Humberto Delgado. A candidatura do "General sem Medo" provocou grande entusiasmo e mobilização popular mas Américo Tomás foi eleito com 75% dos votos deixando no ar a suspeita de manipulação de resultados. Salazar, procurando evitar a repetição de situações semelhantes alterou a constituição substituindo o sufrágio direto pela eleição por um colégio eleitoral. 

Os anos seguintes foram de contestação vinda de todos os quadrantes. Católicos e opositores dos mais diversos fizeram aumentar a repressão do regime. O bispo do Porto D. António Ferreira Gomes, foi exilado por discordar das posições de Salazar e os acontecimentos precipitaram-se. A guerra colonial começara e a contestação aumentava. O exílio e a morte de Humberto Delgado, o apresamento do navio de cruzeiro Santa Maria por Henrique Galvão em 1961, foram episódios que Salazar não conseguiu resolver de forma satisfatória. Galvão e os restantes assaltantes foram entregues pelas autoridades americanas ao Brasil, que lhes ofereceu asilo.  

A questão colonial
Num contexto internacional de descolonização em andamento e a aceitação internacional da legitimidade de autonomia dos territórios coloniais Portugal assumiu uma posição desfasada e em contracorrente das posições internacionais. Baseando-se no lusotropicalismo difundido por Gilberto Freire nos anos 50 e a mística expansionista e nacionalista que fundamentava o Estado Novo Portugal assumiu uma posição de resistência aos movimentos de descolonização que a partir de 1961 afetaram todas as colónias portuguesas. Entretanto na sequência de algumas pressões internacionais que se vinham exercendo no quadro das Nações Unidas e da evolução política internacional no contexto da bipolarização, algumas medidas tinham sido tomadas por Salazar: 
  • 1949 Portugal faz parte da Nato.
  • 1951 revogação do Ato Colonial. Mudança do léxico colonialista. Províncias Ultramarinas em vez de colónias e integração do seu estatuto na Constituição através da reforma constitucional de 1951. 
  • 1955 Portugal subscreve a Carta das Nações Unidas.
  • 1959 Portugal na OCDE. 
  • 1960 Portugal integrado na EFTA.
  • A política económica das províncias ultramarinas foi reformulada e atualizada e o investimento em infraestruturas e na educação pretendia legitimar a ocupação, no quadro do 1º Plano de Fomento de 1953 a 1957: infraestruturas, transportes e sectores extrativos. 
  • O papel evangelizador das Missões Católicas era reforçado com o Acordo Missionário de 1940 e posteriores reorganizações das dioceses e missões apoiadas pelo Estado e governos provinciais. 
  • Com o início das lutas pela libertação opõem-se duas teses: integracionista e federalista. A tese federalista defendia a progressiva autonomia das colónias e a constituição de uma federação de estados que salvaguardasse os interesses portugueses; a tese integracionista simplesmente advogava a continuação do colonialismo. Apesar da contestação de vários sectores da sociedade e do exército, que propunham o caminho da autodeterminação, os primeiros acontecimentos, ocorridos em Angola levaram ao envio de tropas e ao início de uma longa guerra. 


A luta armada 
Os confrontos iniciaram-se no norte de Angola em 1961 mas os movimentos de libertação já existiam antes: 
  • Angola, surgiu a UPA-FNLA em 1955; o MPLA em 1956; a UNITA em 1966. A guerra iniciou-se em 1961.
  • Guiné, surgiu o PAIGC em 1956. A guerra iniciou-se em 1963.
  • Moçambique, surgiu a Frelimo em 1962. A guerra iniciou-se em 1964.
A guerra exigiu um enorme esforço ao Estado português que desviou imensos recursos financeiros para enfrentar uma guerra e desenvolver territórios que estavam condenados a ser perdidos. 

Isolamento Internacional
Diversos acontecimentos e debates na ONU marcaram a contestação internacional à ocupação colonial que nem a retórica nem a semântica institucional e governamental conseguiram mudar. Desde 1955 que Portugal teimava em considerar de forma mal fundamentada que os territórios africanos eram parte integrante da nação e não colónias como eram designadas pelos opositores nomeadamente os países do Terceiro Mundo que contra argumentavam apresentando factos e denunciando situações. A partir de 1961 a posição de Portugal foi condenada nas Nações Unidas tendo a resistência do governo levado ao isolamento progressivo face ao desrespeito pela Resolução 1514

Também a administração americana durante a presidência de Kennedy censurou severamente a posição portuguesa que provocava o extremar de posições dos movimentos armados,  levando estes  a uma aproximação progressiva da União Soviética e de Cuba. Por isso os E.U.A. financiaram grupos armados como a FNLA e a UNITA mas também sugeriram soluções de compromisso com promessas de auxílio económico a Portugal caso recorresse a uma solução pacífica e negociada. 
No entanto a resistência de Salazar foi trágica sabendo usar habilmente o trunfo da base das Lages de que os americanos necessitavam para o seu esforço de guerra no Vietname nomeadamente a partir da presidência de Johnson e Nixon. 


A Primavera Marcelista
Subindo ao poder em substituição de Salazar doente, acreditava-se que Marcelo Caetano conseguiria reformar o regime encontrando uma via para a resolução dos maiores problemas do país: a guerra colonial e a falta de democraticidade do regime. 
Algumas medidas foram feitas: 
  • Abrandamento da repressão pela polícia política
  • Mudança da designação da PIDE para DGS
  • Abrandamento da censura sobre a informação e a criação artística e literária
Outras reformas políticas foram realizadas na preparação para o sufrágio de 1969
  • institucionalização do voto feminino
  • autorização de fiscalização dos cadernos eleitorais pela oposição
  • fiscalização das mesas de voto
  • legalização de agrupamentos políticos da oposição
Os resultados das eleições para a Assembleia Nacional contrariaram as melhores previsões. Os lugares do Parlamento foram todos ocupados por deputados do regime e uma onda de protestos sobreveio nomeadamente nas zonas urbanas mais importantes: protestos de estudantes, operários e gente da cultura fizeram aumentar a repressão e afastar as perspetivas mais otimistas. 

O impacto da guerra colonial
O desejo de resolução da guerra colonial de forma pacífica foi contrariado com a rejeição dessa hipótese pelos principais chefes militares que desejavam a continuação do conflito. Marcelo Caetano embora redigindo um projeto de revisão do estatuto das colónias que levaria a uma autonomia progressiva não teve também o apoio desejado da maioria conservadora da Assembleia Nacional. A política continuou sendo a mesma e a luta armada reforçou-se por parte dos movimentos de libertação principalmente na Guiné. 




Ao mesmo tempo o isolamento internacional acentuou-se e Portugal perdeu gradualmente os aliados, tendo mesmo o Vaticano recebido representantes dos principais movimentos. A O.N.U. reconheceu a independência da Guiné em 1973 e a imagem internacional do governo tornou-se insustentável. 
Na Assembleia Nacional surgiu uma ala liberal corporizada por Pinto Balsemão e Sá Carneiro.  A contestação dos católicos progressistas aumentou bem como a formação de grupos oposicionistas  de extrema esquerda como a LUAR de Palma Inácio. Alguns sectores do próprio exército reconheciam a necessidade de uma solução negociada e o fim da guerra colonial e gradualmente Marcelo Caetano apercebeu-se de que o regime estava sem saídas em vésperas de 25 de Abril de 1974. 

segunda-feira, 7 de março de 2022

OA ANOS 60 E O INÍCIO DE UMA NOVA MENTALIDADE: OS MOVIMENTOS DE CONTESTAÇÃO JUVENIL

 Ao longo da década de 60, a canção converteu-se num instrumento de crítica social e política, denunciando a pobreza, o racismo, a destruição da natureza, as armas nucleares e a guerra.


Assim, o rock assumiu-se como um dos pilares da contestação juvenil. 
O número de jovens no mundo ocidental era considerável, devido ao baby-boom do pós-guerra, e estes buscavam um estilo de vida diferente do das gerações anteriores, acomodadas aos padrões da vida burguesa, dando início a um poderoso movimento de contestação.
Este movimento teve origem em universidades europeias e americanas, onde o sistema de ensino e as regras de funcionamento, considerados antiquados, eram postos em causa pelos estudantes.
Nos EUA, as universidades de Berkeley (São Francisco) e Columbia (Nova Iorque) foram ocupadas em 1964, pelos estudantes que exigiam mudanças radicais.

Para além das suas reivindicações específicas, os estudantes americanos mostravam-se atentos aos grandes problemas da sociedade em que viviam: envolviam-se ativamente na luta pelos direitos cívicos dos negros,


a emancipação da mulher,

e o movimento pacifista que surgiu contra a participação dos EUA na guerra do Vietname, cujas manifestações mobilizavam multidões, em particular estudantes, na América ou noutras cidades europeias.




Em 1968, Paris tornou-se no centro de uma revolta estudantil que atingiu a Europa. Conhecida pelo nome de "Maio de 68"  atingiu a Sorbonne e o Quartier Latin tornou-se num campo de batalha entre estudantes e polícia. Dinamizados por uma minoria politizada, que tinha como referenciais as figuras revolucionárias de esquerda, os estudantes denunciavam a falta de condições das universidades, com poucos professores e falta de instalações. Ao mesmo tempo, clamavam contra a guerra do Vietname, o imperialismo americano e o totalitarismo soviético.


Esta crise, que começou por ser um problema estudantil, rapidamente se tornou numa sublevação social e política, com greves e ocupações de fábricas.
O Maio de 68 tornou-se num símbolo dum combate para o qual contribuíram o conflito de gerações, o descontentamento social e a reação ao autoritarismo. Por isso, as suas repercussões passaram para lá da cortina de ferro e fizeram-se sentir na cidade de Praga que nesse ano se revoltou contra a invasão soviética.
Outra faceta da contestação juvenil fez-se sentir na revolução dos costumes desencadeada pelo movimento hippie (com epicentro na Califórnia, com destaque para a cidade de São Francisco em 1967).




Os jovens levavam uma vida alternativa em comunas. eram adeptos da liberdade sexual, do amor livre e amantes da paz (make love not war). Os hippies evidenciavam um total despojamento e despreocupação, visíveis no vestuário leve, colorido e florido, nos cabelos soltos e compridos, muitas vezes descalços, no consumo de drogas alucinogénias.


Grandes confraternizações e festivais de música ao ar livre reuniam essas multidões de jovens, como o conhecido festival de Woodstock (1969).
Estas multidões de jovens, assumiam-se, assim, como protagonistas de uma contracultura (através de um estilo de vida que denuncia os valores materialistas da sociedade, contrapondo a ausência de regras sociais e morais, o espiritualismo, o pacifismo, o regresso à Natureza.

quarta-feira, 2 de março de 2022

AS TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS E CULTURAIS DO TERCEIRO QUARTEL DO SÉCULO XX

 No segundo pós-guerra, Nova Iorque substitui Paris como capital das artes (doc. 1, p.150 e doc. 2, p. 151). É lá que surgem novas formas de expressão que versam o absurdo da existência e ironizam sobre os ritos sociais. As novas correntes mostram-se herdeiras do legado vanguardista da primeira metade do século (em particular do abstracionismo, do dadaísmo e do surrealismo) e da reflexão sobre a condição humana incrementada pelo existencialismo (p.156, doc. 12), de que são exemplos Jean-Paul SartreSimone de Beauvoire e Albert Camus.


Jackson Pollock exemplo do expressionismo abstrato (1945-60)
A partir de 1958 surge uma outra corrente, a pop art - significando literalmente arte popular - pretendendo exprimir uma aproximação à cultura e aos meios de comunicação de massas. Integrava objetos e temas da sociedade de consumo no mundo da arte. O grande representante americano da pop art foi Andy Warhol (doc. 6, p. 154).
Algumas vanguardas dos anos 60 e 70 levaram até às últimas consequências a desmaterialização da arte (muito inspirada no absurdo dadaísta). É a chamada arte conceptual (docs. 9, 10, 11, p. 155) que se caracteriza por secundarizar a obra de arte enquanto objeto físico, privilegiando o conceito ou ideia que lhe está subjacente.
Entretanto, a América é também o berço de muitos dos grandes progressos científicos e tecnológicos que revolucionam a produção, as comunicações, a sociedade e a vida humana - a robótica, o computador e o pc,  a energia nuclear, o laser,  os aviões supersónicos, o circuito integrado, a tac, a fertilização in vitro, a estrutura do ADN, os transplantes de órgãos ... (pp. 158 a 161).
Dos EUA irradiam os padrões culturais e os hábitos consumistas. 



O cinema, a televisão, disseminada nos anos 50, e o rock and roll difundem a imagem de um mundo próspero, despreocupado e feliz.



Até 1962, as estrelas americanas brilharam no rock and roll mas a situação mudou com o aparecimento dos Beatles.
A evolução qualitativa levada a cabo por este grupo e o impacto das suas canções entre os jovens dos mais variados estratos sociais e países, fez com que a música pop passasse a integrar o universo da arte, deixando para trás o estigma de produto de "baixa cultura". 
Os Rolling Stones foram outro êxito da música britânica mas, no entanto, criaram uma imagem de "perigosos degenerados", que os demarcou dos Beatles, mas que se coadunava com o espírito irreverente do rock.
No entanto, há quem resista à padronização da cultura americana, o que é bem visível na produção cinematográfica que vai surgindo na Europa e na Ásia como alternativa à produção de Hollywood.
Por exemplo, o cinema indiano, a partir da década de 50 ou o cinema japonês de que tomamos como exemplo um excerto dos Sete Samurais (1954) do mestre Akira Kurosawa:


Em Itália faz escola a corrente do neorrealismo de que são exemplo Vittorio de Sica com Ladrões de Bicicletas (1948):


ou Roberto Rosselini com Roma, Cidade Aberta (1945)


Em França surge o movimento da Nouvelle Vague, com cineastas como François Truffaut, Claude Chabrol ou Jean-Luc Godard.


O realizador sueco Ingmar Bergman surge com a exploração de temas intimistas, grande preocupação estética e forte componente teatral:
No mundo ocidental, os jovens, as mulheres, os ecologistas, as minorias étnicas são os responsáveis pela organização de movimentos de contestação que abalam os alicerces da sociedade capitalista.